Ainda sobram resmungos de revolta incontida,
no mínimo, de decepção alastrante, ante o desfecho do que a ignorância ou a má
fé carimbou como crise institucional uma divergência de entendimento quanto ao
que podem, e devem fazer, no quesito das imunidades parlamentares o Supremo
Tribunal Federal e o Senado da República, valendo o mesmo, por extensão, à
Câmara dos Deputados.
Tudo girou em torno do que diz e do que não
diz a Constituição do Brasil, que muita gente em destaque e com poder de
influência sobre a opinião pública parece nunca ter lido e se leu não entendeu
e se entendeu logo depois esqueceu.
Por isso essas conclusões enviesadas de que o
Supremo Tribunal Federal perdeu poder ao remeter para o Senado a decisão se
mantinha ou não suspenso de suas funções e sob medidas alternativas um Senador
da República. No Estado Democrático de Direito não existe isso.
A crise institucional que não houve, é bom
lembrar, foi mais uma daquelas derrapadas típicas da afoiteza inconcebível em
quem, ainda que aprovado em concurso ou em sabatina, não alcançou a maturidade
e a prudência indispensáveis ao oficio de realização da Justiça.
A Constituição da República resume esses
pré-requisitos indispensáveis aos que se propõem, um de lado a denunciar e do
outro a processar e julgar, a essas duas expressões singelas - notável saber
jurídico e reputação ilibada. Não é tão fácil.
Os agentes do Ministério Público atuam sob
garantias constitucionais idênticas às dos Magistrados – não podem ser
removidos, não podem ser demitidos e não podem ter seus salários reduzidos.
Não são privilégios deles. São garantias da
sociedade para que todos tenham direito ao devido processo legal, à ampla
defesa, ao exercício do contraditório. Para que qualquer acusado tenha
assegurados esses direitos, inclusive o de não ser processado por juízo ou
tribunal de exceção, os agentes do Ministério Público e os juízes de todos os
tribunais gozam de todas as proteções legais.
Como todo poder emana do Povo que o exerce
por meio de representantes eleitos, ou diretamente na forma estabelecida pela
Constituição, o mandato popular para que seja efetivamente exercido, sem
ameaças ou medos, confere ao eleito, desde a diplomação, a imunidade
parlamentar pela qual são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de
suas opiniões, palavras e votos.
Nos termos da Constituição, os crimes comuns
dos congressistas não acobertados pela imunidade, são processados e julgados
pelo Supremo Tribunal Federal, mas os Deputados ou Senadores somente poderão
presos em casos de flagrante delito de crime inafiançável, mas ainda assim, os
autos do flagrante terão que enviados à Câmara ou ao Senado, conforme o caso,
dentro de 24 horas para que pelo voto da maioria se resolva sobre a prisão.
Oportuno registrar que inafiançáveis são,
além de matar alguém, os chamados crimes barra pesada, tipo tráfico de drogas,
armas ou de pessoas, racismo, terrorismo, estupro – evidente que nenhum desses
pegaria bem a um representante do povo.
A jurisdição do Supremo se efetiva depois do
recebimento formal da denúncia do Ministério Público indispensável à
instauração da ação penal. Ainda assim, poderá o parlamentar processado seguir
com o mandato até o final, desde que a Câmara ou o Senado resolva, por maioria
de votos, sustar o processo e ao mesmo tempo o prazo de prescrição.
Isso significa dizer que, em respeito à
soberania popular, o congressista poder continuar livremente no mandato, mas
com data certa para a reabertura do processo, no caso a data do seu término.
Isso é o que está escrito na Constituição do
Brasil. Ah os Ministros do Supremo? Havendo denuncia por crime de
responsabilidade, são processados e julgados pelo Senado. Como foi a Dilma. O
Procurador Geral da República não só é processado pelo Senado como o Senado
pode tirá-lo do cargo, ex-ofício, em plena duração do mandato.
Então, melhor levar para casa e começar a
ler, além da sua bíblia, a Constituição do nosso País. Cada caso tem sua
peculiaridade própria. Mas nada acima nem abaixo da Constituição.
(Edson Vidigal, Advogado, foi Professor
de Direito na Universidade de Brasília e Presidente do Superior Tribunal de
Justiça e do Conselho da Justiça Federal)
0 comentários:
Postar um comentário