Doença está mais perto de possibilidade de cura
Neurônios: Em pacientes
com ELA, as proteínas se aglomeram
em composto tóxico que adoece a célula e a
mata
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RIO - Doença que vem recebendo grande atenção nos últimos anos — especialmente
com o “desafio do balde de gelo”, que tomou a internet em 2014 —, a Esclerose
Lateral Amiotrófica (ELA) está mais perto do que jamais esteve de uma
possibilidade de cura. Um dos grandes obstáculos para entender como essa doença
neurodegenerativa surge é o fato de os cientistas não saberem que tipo de
relação entre as células faz os neurônios motores morrerem. O mistério, porém,
terminou ontem. Pesquisadores da Escola de Medicina da Universidade da Carolina
do Norte, nos EUA, divulgaram a primeira descrição científica de como as
proteínas neuronais se aglomeram em um composto tóxico que torna a célula
doente e, por fim, a mata.
Publicado na edição on-line da revista
“Proceedings of the National Academy of Sciences” (PNAS), o estudo é
considerado um passo crucial para o desenvolvimento de drogas que possam
interromper a formação desses aglomerados e deter a progressão da doença, que
costuma ser severa. Pacientes com ELA sofrem paralisia e morte precoce, em
consequência da perda de neurônios motores, que são essenciais para se mover,
falar, engolir e respirar.
O portador da doença mais conhecido
mundialmente é o físico britânico Stephen Hawking, de 72 anos, que descobriu o
problema aos 21 anos. Na época, os médicos chegaram a dizer que ele teria
apenas alguns anos a mais de vida. Hawking, no entanto, não só superou as
sombrias previsões como se tornou um dos cientistas mais respeitados do mundo
depois do diagnóstico, apesar das limitações físicas impostas pela ELA.
MEDICAMENTOS
À VISTA
Com o mistério sobre o surgimento da doença
aparentemente resolvido, cientistas se mostram esperançosos com a possibilidade
de um controle sobre este e outros males neurodegenerativos.
— Um dos maiores enigmas da saúde tem sido
como lidar com doenças neurodegenerativas. Ao contrário de muitos tipos de
cânceres e outras condições, nós não temos, no momento, qualquer poder contra
essas doenças — destacou o autor sênior do estudo, Nikolay Dokholyan, professor
de Bioquímica e Biofísica na Universidade da Carolina do Norte. — Este estudo é
um grande avanço, pois lança luz sobre a origem da morte dos neurônios motores
e poderá ser muito importante para a descoberta de medicamentos.
O estudo se concentra em um subconjunto de
casos de ELA que estão associados a mutações em uma proteína conhecida como
SOD1. Estima-se que de 1% a 2% dos pacientes têm esse tipo de variação. No
entanto, mesmo no restante dos pacientes, a proteína SOD1 tem a capacidade de
formar aglomerados potencialmente tóxicos no cérebro. Os pesquisadores
descobriram que a SOD1 cria aglomerados temporários de três moléculas,
conhecidos como trímeros, capazes de matar células neuronais motoras cultivadas
em laboratório.
— Este é um passo importante porque até agora
ninguém sabia exatamente quais interações tóxicas estão por trás da morte de
neurônios motores em pacientes com ELA — disse Elizabeth Proctor, que é autora
principal do estudo e era estudante de pós-graduação no laboratório de
Dokholyan quando a pesquisa foi realizada. — Sabendo como esses trímeros são,
podemos tentar projetar drogas que iriam impedir a formação deles ou
sequestrá-los antes que eles possam causar danos. Estamos muito animados com as
possibilidades.
CONJUNTOS
SÃO A CHAVE
A relação entre a ELA e mutações da proteína
SOD1 foi observada ainda no início dos anos 1990. Entretanto, a forma exata
pela qual a proteína se agregava demorou mais de duas décadas para ser
identificada. Um dos aspectos que dificultaram essa descoberta foi o fato de
esses aglomerados tóxicos se desintegrarem pouco tempo depois de sua formação,
o que faz com que eles sejam extremamente difíceis de estudar.
— Acredita-se que o que os torna tão tóxicos,
em parte, é a sua instabilidade — explicou Elizabeth, que agora é pesquisadora
de pós-doutorado no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT). — Sua
natureza instável os torna mais reativos a partes da célula que não deveriam
afetar.
Para desvendar o mistério de como é a
aparência desses aglomerados e como eles afetam as células, a equipe de
pesquisa usou uma combinação de modelagem computacional e experimentos em
células vivas. Elizabeth passou dois anos desenvolvendo um algoritmo
personalizado para determinar a estrutura dos trímeros. Esse feito foi
comparado a mapear a estrutura de um novelo de lã depois de fotografar trechos
apenas da sua camada mais externa e, em seguida, descobrir como todos se
encaixam.
Uma vez que a estrutura dos trímeros foi
estabelecida, a equipe passou vários anos desenvolvendo métodos para testar os
efeitos dos trímeros em células neuronais motores cultivadas em laboratório. Os
resultados foram claros: proteínas SOD1 que se ligaram em trímeros foram letais
para as células neuronais motores, enquanto as outras proteínas SOD1 não
prejudicaram o organismo.
Daqui para frente, a equipe pretende
investigar a “cola” que mantém as trímeros unidos, a fim de encontrar drogas
que possam separá-los ou evitar que eles se formem.
Além disso, dizem os estudiosos, esta
descoberta pode ajudar a lançar luz sobre outras doenças neurodegenerativas,
como os males de Alzheimer e de Parkinson, entre outras.
— Há muitas semelhanças entre as doenças
neurodegenerativas — ressaltou o professor Nikolay Dokholyan. — O que nós
encontramos aqui parece corroborar o que já se sabe sobre o Alzheimer, e se
pudermos descobrir mais sobre o que acontece na ELA, existe potencial para
compreender as raízes de muitas outras doenças neurodegenerativas.
FONTE:
O GLOBO
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