Nos idos de 80, do século XX, iniciei aproximação ao Partido
dos Trabalhadores de Caxias-MA. Lembro-me de pioneiros do PT no Maranhão. A
candidata a governadora, por São Luís, Delta Martins, e o candidato a senador,
por Caxias, Vicente Pereira, são dois exemplos de “sacrificados”, como se
dizia, sobre os que dispunham seus nomes, conscientes das mínimas condições
eleitorais, apenas no sentido da almejada “construção partidária”.
Depois de “sacrificarem” seus nomes, mas
alcançarem significativas visibilidades interna e externa, a professora Delta e
o camponês Vicente foram aos poucos sendo desprestigiados pela “corrente”
petista hegemônica no Estado, conhecida como “PT de Aço”, que, por razões mais
históricas que de qualificação política e cultural, segundo me afirmou certa
vez Fernando Magalhães (STIU-MA), controlava o partido e a CUT nas suas origens
no Maranhão.
No ano de 1985 foi criado o Grupo de Teatro
Sombras-GTS, depois de uma experiência da Secretaria de Cultura de
Caxias-MA. que viabilizou cursos com Aldo Leite e Tácito Borralho (Reinaldo
Faray não veio). Como militantes da causa cultural no município os
membros do GTS defendiam que cultura e política não podiam ser tratadas como
fenômenos estanques, separados. Desta forma, a grande maioria
dos textos escolhidos para encenações
tinha relação com os debates que se fazia nos partidos de esquerda.
Uma explicação para esta “orientação” cultural esquerdista é o fato de que os
membros do GTS mantinham relações com o PT, PCB e PDT. O meu caso era sui
generis quanto a esta conduta, pois mantinha estreitos contatos
com petistas, pecebistas e pedetistas, além do envolvimento com a luta pelo
Sindicato dos Comerciários.
A base cultural que a vivência do/no Sombras proporcionava
aos seus membros permitia um olhar crítico sobre a realidade social, inclusive
sobre os agentes políticos que organizavam e dirigiam os partidos de esquerda
em Caxias e que, acreditava-se, deveriam governar a
cidade.
No GTS lia-se muito e se debatia tudo. Autores como Ariano
Suassuna (1927-), Lourdes Ramalho (1923-) e Plínio Marcos (1935-1999) eram
algumas das influências teóricas dramáticas dominantes. Além das leituras dramáticas
e de preparação técnica como Augusto Boal (1931-2009), Ruth Escobar (1936-2012)
e Constantin Stanislavski (1863-1938), circulavam também jornais e
panfletos partidários.
Assim, a cultura geral “sombreira” gerava tensão
face a pouca ou quase nula preparação teórica dos quadros dirigentes de
partidos como o PT. Tensão que buscava equilíbrio entre a convicção
da necessidade dos trabalhadores se autogovernarem e a suspeita
instalada da necessidade de preparação técnica para se dirigir uma
cidade, ainda que do porte da Caxias da segunda metade de 80.
Era angustiante para alguns “sombreiros”
ouvir as falas, os discursos; perceber o pensar ingênuo, vezes
atoleimado, dos quadros dirigentes, presas fáceis de um(a) ou outro(a)
“doutor(a)” que oportunamente resolvesse se aproximar do partido. É que
predominava entre os “sombreiros” a paixão por uma estética
política, verificada nas reuniões partidárias petistas, que permitia uma
discussão plural onde qualquer um exercia os poderes da voz e do voto. Analfabetos
e escolarizados pareciam iguais.
Um caso particular de consciência ingênua dirigente é
emblemático ao ponto de ter motivado esta reflexão. O principal dirigente
petista da época, um trabalhador da construção civil, após
participações nos mais diversos cursos de formação sindical e
política, no país e no exterior, desconhecia até bem pouco tempo as ideias
expressas no clássico político O Príncipe, de Nicolau Maquiavel
(1469-1527). É de se questionar: o dinheiro dos trabalhadores, investido na
formação de “quadros” populares, tem se justificado?
Esse ex-dirigente defende hoje o que chama de
“pragmatismo”, pois afirma “não ter mais idade e saúde para sonhos”
e que não ver problemas celebrar alianças com os opressores Coutinhos ou
Marinhos. Pior, ainda, esse “pragmatismo” pode se firmar
como tendência no PT de Caxias-MA.
Viajando no Estado, em um ônibus, o ex-dirigente petista
lia O Príncipe, quando foi abordado por um ex-petista, professor
universitário, que se sentou ao seu lado. Como estava fortemente envolvido com
a “sua” leitura de Maquiavel, expressou ao professor o seu encantamento tardio
com as ideias do florentino: __ Tudo o que está escrito aqui é a pura verdade.
O que fizemos e acreditamos naquele tempo em Caxias era ilusão.
Algumas vezes expressei junto a um pequeno círculo de amigos
a minha desconfiança quanto ao que considerava uma “militância cega”,
ingênua, de dirigentes do PT, dos idos de 80, em Caxias-MA. Aquela
sinceridade me gerou desconfortos, inclusive com um ou dois amigos mais
próximos que me criticaram de “elitista”. Após ouvir recentemente o relato do
professor, companheiro de viagem do ex-dirigente petista local, não pude deixar
de pensar que eu estava certo naquela época.
(Este texto objetiva
contribuir com as reflexões que estão sendo feitas no PT-Caxias, relacionadas
ao PED 2013 que culminará no dia 10.11.2013).
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