Por Edson
Vidigal, advogado,
foi Presidente do Superior Tribunal de Justiça e do Conselho da Justiça
Federal.
Largada no chão, a calcinha de lingerie vermelha e
branca foi ficando.
Houve quem a visse ainda no ar, caindo de uma
altura de meio metro. Ninguém, até então, se atreveu a apanhá-la.
Há quem diga ter visto um excelentíssimo, naquele
plenário cheio de Deputados, meter a mão no bolso como se fosse tirar
alguma coisa, e certamente não uma calcinha, e tirou o que?
A calcinha foi ficando ali no chão, abandonada,
como aquele cão do poema de Pessoa – tolerado pela gerencia por ser inofensivo.
Afinal, a quem o vermelho e o branco, na
sensualidade daquele lingerie, poderiam ofender?
Ao decoro parlamentar, sentenciou um líder.
Ih, gente, isso dá uma boa confusão, Conselho de
Ética, quem sabe até uma CPI, imaginam os coleguinhas das editorias de
politica.
Seguem-se as especulações engatando os
preparativos. Uma CPI apenas não vai dar conta. Outra Operação Lava Jato, quem
sabe?
O fato, afinal, é incomensuravelmente grave e com
repercussões muito danosas para as instituições politicas, para os bons
costumes e para a moralidade pública - avaliam os consultores especialistas em
ética constitucional, contratados sob a inexigibilidade de licitação.
Urge então que as providencias sejam logo definidas.
Uma delação premiada levará a policia ao nome do
primeiro suspeito cujo nome aparecerá em todos os telejornais da meia noite.
Especula-se ainda que o excelentíssimo (ou
excelentíssima?) irá depor também no Conselho de Ética, sob acusação de
atentado ao decoro parlamentar. E se for pego (ou pega?) na mentira, pior.
Mentira no parlamento dá cassação.
E a CPI, qual será o fato determinado a
justificá-la? CPI, dizem os sábios, todo mundo sabe como começa e ninguém sabe
como acaba. A própria calcinha pode ser a prova de alguma coisa com começo
previsível.
Que tal começar ocupando as primeiras páginas dos
jornais, capas de revistas semanais, telejornais, comentários do Camaroti
e da Cris, chamando em Veneza o Mainardi, o Caio Blinder em Nova Iorque ou o
Ricardo Amorim em S. Paulo, todo mundo opinando, inclusive sobre as influencias
na Bovespa e na Nasdaq dessa calcinha largada no chão do parlamento? As bolsas,
afinal, tem sua porção qualira – são muito sensíveis.
Na semana seguinte, nos grampos, sempre com
autorização da Justiça, haverá um cara falando sobre a calcinha vermelha e
branca para outro cara, - huuum, sei nãooo, nada disso...
Nos trechos selecionados, a impressão será de que
os envolvidos falam de algum negocio, mas as frases curtas só ampliarão as
suspeitas, aumentando o suspense e a indignação popular.
As imagens das câmeras de segurança do plenário
serão requisitadas confirmando que o Deputado (ou Deputada) que largou a
calcinha no chão durante a votação é mesmo o fulano (ou fulana), a esta altura
trucidado (ou trucidada) a caminho do Conselho de Ética pelos colegas
moralistas e pelas moçoilas da TV com perguntas, as mais desconcertantes.
Quem lhe mandou, nobre colega, ser marinheiro
(ou marinheira) de primeira viagem achando que a Câmara dos Deputados é mesmo
tudo isso que maldosamente se diz por aí?
É chamada de câmara baixa, sim, mas não é picadeiro
para baixarias como essa de se atirar calcinha como se o tapete do plenário
fosse cestinha de regalos de algum motel do Turú.
Impossível saber quem dentre aquelas centenas de
representantes do Povo, sem fazer um discurso, sem um gesto de mimica obscena,
ousou atentar contra o decoro parlamentar.
Enquanto isso corre solta a coleta das assinaturas
para a CPI. Um repórter de uma semanal já localizou uma testemunha – bomba que
deu uma entrevista – bomba. Tudo poderá ir pelos ares. Há mais gente na fila
para as delações premiadas.
O Deputado da calcinha, contou a testemunha – bomba
na entrevista é só a ponta do iceberg de um poderoso esquema de contraventores
especializados em lingerie da China via Paraguai.
O lance da calcinha no plenário teria sido mera
jogada de marqueteiros da ultima campanha para chamar atenção do País à próxima
Proposta de Emenda Constitucional fazendo voltar a CPMF de cuja arrecadação se
financiará também a nova bolsa dos programas sociais do Governo, a
bolsa-calcinha.
Isso tudo na justa causa do combate à pirataria de
marcas, à sonegação fiscal e aos propinodutos de financiamentos de campanha
eleitorais.
Óbvio que na semana que vem ninguém mais vai se
lembrar disso. Outro escândalo quentinho, saindo do forno, estará a caminho.
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