Minha Figura

Mutilada

14.8.14
Por Edson Vidigal, advogado, professor e ex-ministro do STJ

A esperança quase que agoniza e a Nação parece esmorecer sempre que um servidor público atravessa aquela ponte invisível, inarredável e inevitável.

A ninguém é defeso saber quando e como. A certeza irrevogável a marcar todos nós por essas paragens terrenas é a de que a travessia da ponte acontece a cada um na sua vez.

O Eduardo nascido para ver o mundo com seus olhos azuis, mas nem por isso de modo a se conformar com a injustiça das desigualdades sociais, lega às novas gerações convicções e atitudes de um servidor público exemplar.

Por décadas o Presidente da República viajou naquele avião que de tão velho e inspirador de medos ficou conhecido como sucatão. Foi a bordo do sucatão numa viagem do Lula a Petrolina – PE que conheci de perto o Eduardo.

Na cabine reservada ao Presidente e seus convidados estavam além do Eduardo, a Dilma, o Humberto, o Bebeto e o Carlos Wilson.

O Lula chamava os Ministros e enquanto viajavam cobrava relatórios e providencias da área de cada um.

Era tudo tão informal que até eu, que estava ali apenas como um convidado do Presidente fui instado por ele a dar opinião.

O Eduardo, na sua vez, me impressionou pela exatidão dos números, a clareza na exposição, o entusiasmo de um espirito público à flor da pele. Inescondível que o Lula gostava muito dele.

Quando, ao depois, renunciei à Presidência do STJ, desincompatibilizando-me para disputar as eleições para Governador do Maranhão e não sabendo ainda por qual partido, filiei-me ao Partido Socialista Brasileiro e o Eduardo fez questão de abonar-me a ficha numa solenidade em Brasília, a que compareceram a Renata, sua companheira da vida inteira e a Euridíce, quanto a mim também.

Numa reunião do PSB em Recife-PE, estive com Eduardo, já então Governador no primeiro mandato e vendo aquela sua garra pelo interesse pública era algo assim transpirante, provoquei-o indagando se não pensara em candidatar-se a Presidente da República. Respondeu que ainda teria muito a fazer no seu Estado.

Saí de Recife convencido de que o Eduardo preparava-se como um aluno aplicado para as difíceis provas presidenciais. No segundo mandato, não deu outra. Com resultados, os mais positivos, obtidos por sua gestão, estava aí o Eduardo irradiando entusiasmo e esperanças ao Brasil.

O Eduardo fez a travessia da ponte a bordo de um excelente e moderno avião que caiu no tempo ruim, de visibilidade nenhuma, quase chegando aonde queria chegar – ao chão firme da cidade de Santos, em São Paulo.

Uma vez eu iria a Imperatriz fazer uma palestra numa reunião da bancada da Amazônia no Congresso Nacional. Seria um dos passageiros do avião no qual iriam três ou quatro Deputados estaduais, dentre eles o meu amigo João Silva, do Pindaré.

Pouco antes de embarcar para São Luís, o Madeira, então Presidente do Instituto Teotonio Vilela e hoje Prefeito de Imperatriz, me telefonou informando que eu estava na lista dos que iriam no sucatão da Presidência da República, o que mesmo que plantou tanto medo em tanta gente até o Lula mandou comprar um avião novo e moderno, o Aero lula.

A reunião foi cancelada antes da decolagem do sucatão. O avião com os Deputados despencou de um nevoeiro. Não escapou ninguém. O Madeira foi o estafeta do anjo que mandou me tirar da fila da ponte. Tenho muitas outras sobre escapadas de avião. Acho até que como o Eduardo vou atravessar a ponte voando.

Escrevo em estado de choque. Poucas vezes uma mutilação na asa de uma esperança me doeu tanto como essa que tocou na esperança que se encarnava no Eduardo.

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