* Por Francinaldo Morais
(...) a função da imprensa é ser o cão-de-guarda público, o
denunciador incansável dos dirigentes, o olho onipresente, a boca onipresente
do espírito do povo que guarda com ciúme sua liberdade (K. Marx, A liberdade de
imprensa, 1980, p.68).
Um dia destes de outubro de 2013, fui procurado em minha
residência por um amigo, “das antigas”, que me pediu para ajudá-lo
em uma ideia. Narrou-me que, cansado de trabalhar como empregado (pessoa
física, natural), está decidido a se transformar em pessoa jurídica (empresa)
tendo em vista prestar serviços para ex-patrões do setor de comunicação local
(TVs e Rádios).
Justifica, esse amigo dileto, que já foi muito explorado
nessas empresas, com acúmulo de funções (locutor anunciador, locutor operador,
operador de áudio etc) e que pensa poder ser melhor reconhecido como empresa
(P.J.).Perguntei-lhe se ele já teria ouvido falar em “pejotijação”.
Respondeu-me que não.
Simplifiquei: “pejotização” é uma nova palavra, derivada da
sigla P.J.(Pessoa Jurídica). Uma vez que em uma relação de emprego
deve sempre figurar uma pessoa física (CLT, 2º e 3º), sendo regida a
relação pelo Código Obreiro, a transformação do empregado em pessoa jurídica (“pejotização”),
descaracteriza essa relação e a arrasta para um contrato privado, regrado pelo
Código Civil. No aspecto formal, a manobra aparenta legalidade; no aspecto
material, trata-se de uma ficção trabalhista, uma fraude tributária,
previdenciária e contra a proteção do trabalho. Aqui vale a máxima: criminosos
e crimes andam sempre à frente da Lei.
Informei-lhe que sob o pretexto de dar maior racionalidade
ao sistema produtivo, capitalistas (empresários) brasileiros (e de outras
partes do mundo) vêm adotando novas experiências fraudulentas de relações de
trabalho. Sendo assim, a “pejotização” é mais uma das espécies de ataque sobre
os trabalhadores, com o agravante de nela serem camufladas a precarização da
relação trabalhista e a criação de dificuldades da/na sua proteção
legal (Sindicatos, Varas do Trabalho, DRT, TRT). Confortei--lhe informando que
os operadores do Direito Trabalhista estão atentos. Sabem que a “pejotijação”
não resiste ao confronto com princípios como o da “primazia da realidade” (CLT,
9º, 442 e 461).
Não obstante, disse-lhe, ainda, que tome muito cuidado,
pois, empresários acostumados com práticas de
precarização das relações trabalhistas passaram a ver na “pejotização” mais uma
forma de aumentar os seus lucros, iludindo trabalhadores, principalmente os que
desenvolvem atividades intelectuais (Lei 11.196/2005, artigo 129).
Para ilustrar, complementei que tenho observado, pela
televisão, um jornalista muito conhecido em Caxias, um ex-aluno de
História, afirmar que não é empregado do dono da empresa onde trabalha; que é
pessoa jurídica, tem autonomia, pensa e fala o que quer (?); que é um prestador
de serviços. Como ele repete goebbelsianamente isto quase todos os
dias, acabará nos fazendo acreditar na ficção que
divulga.
Em verdade, impossibilitados de perceber/entender
criticamente formas novas e sofisticadas de opressão, com seus desdobramentos
negativos para si e para o conjunto dos trabalhadores, não é incomum ver
indivíduos defendendo a “pejotização”. Uma interpretação possível para essa
conduta equivocada é que de tanto o opressor praticar arbitrariedades contra
seus trabalhadores, alguns destes passam a desejar e até defender procedimentos
opressivos como algo bom. Para finalizar, disse ao meu amigo jornalista, necessitado
da minha ajuda crítica, que esta interpretação pode se ajustar a
conduta daquele meu ex-aluno de História, que tenho observado, reiterar com
veemência, agir e pensar livremente, em uma empresa que funciona como um
partido político.
* Francinaldo Morais é professor de História, membro do IHGC e
acadêmico de Direito.
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